domingo, 12 de abril de 2009

Idades temporais


Não existem dias perfeitos. Apenas, as horas atrás de horas num relógio que não pára. A claridade do dia contrasta facilmente com o cair da noite, tão rápido que nem sentes o seu fim. Ou o seu início. Ou o seu decorrer, com o forte raiar do sol entre pequenas nuvens.
Nessa tarde, o sol preferia manter-se entre duas tímidas nuvens. O vento também não parecia interessado, remetendo-se timidamente entre o nosso respirar. De resto, a vida normal de um dia a dia aparentemente alegre, onde se mistura a beleza do jardim com a agitação permanente de que passa por ali.

No entanto, o simples banco verde chamava por mim, a idade já não perdoa. As pernas haviam sido jovens, em tempos, mas agora resguardam anos de intensas caminhadas. Ou correrias atrás do que eu pensaria, algo novo. Até o simples gesto de sentar parecia-me um eterno descanso, preferindo sentir a agitação alheia. De olhar atento, percebia-se o confronto de idades que eu tanto gostava de apreciar. E passando a mão pela rugosa cara, sentia que aqueles já haviam sido os meus tempos. Restava-me olhar, e nada mais do que apreciar sentado num banco de jardim. Repetia isto três vezes por semana. Tirando as que passava no médico, ou as que preferia outros locais com um simples banco de jardim. Como eu gostava destes bancos, como já gostara de viver.

Ali sentado, apreciava o meu redor. E imaginava-me, rejuvenescido como nunca, correndo atrás de uma bola, com dois colegas a gritarem comigo insancemente á espera de um passe. Junto á vedação, as meninas, tímidas, á espera que o seu preferido jovem lhes dedicasse um golo. Ou dois. Mais á frente, o início do parque, e da vida. Cada mãe passeava um pequeno carro com um bebé, orgulhosas como nunca. Também me senti orgulhoso quando os meus dois filhos decidiram nascer. Ou até o meu pequeno neto, agora um daqueles corredores atrás da bola. Essa, uma das razões que me faziam estar ali.
Debaixo desta árvore, imagino os meus tempos de criança. Diferentes e iguais, à vida de uma simples criança actual. Pensar que tudo passou sem o devido proveito. Pensar que dos meus trinta anos, passei para sessenta, numa rapidez invulgar que nem eu sei explicar. Pensar que sou culpado por esta falta de anos que se nota em cada passo meu. Pensar que com a preocupação de seguir em frente, de procurar trabalho e de me alimentar como o médico me sugeria, perdi a noção do que é sorrir verdadeiramente. Soltar aquela gargalhada que te faz perder o ar, ou sentir o raiar do sol mesmo por dentro de nós. Ou até de correr entre amigos atrás de uma bola de trapos, como em tão poucas vezes fiz. Ou até de piscar o olho àquela menina que tantas vezes me via a passear, sem eu próprio ligar, preferindo seguir com o rosto rosado, fugindo á minha própria adrenalina.

Hoje, sinto-me culpado pelo que vivi. Mas principalmente pelo que não vivi. Pelo que me resta observar a juventude que á minha volta circula, dizendo repetidamente ao meu neto:
Não deixes de fazer porque pensas que amanhã aparecerá a mesma oportunidade. Faz do teu dia de amanhã, o teu dia de hoje. E verás que quando chegares aos meus sessenta, já terás vivido eternidades.

Feliz pelo meu neto, já era hora de ir embora. A hora de jantar estava marcada, e aquela doce menina que antes me seguia com um sorriso, agora estará zangada se não chegar a horas. Devagar, lá chegarei. Até lá, vou aproveitando o sol. Amanhã, até pode ser que chova. Nunca se sabe...
.Foto de José Boldt

5 comentários:

Anónimo disse...

este texto fez me lembrar mesmo o meu avô.

:/

Marta Pragosa disse...

Está tão bonito o texto. :)
Faz-me lembrar, um pouco, a publicidade da Coca-Cola, que eu adoro! *.*
Afinal a inspiração estava escondida. :P

Beijinho. *

Anónimo disse...

Oh m.a. sinceramente fizeste-me recordar os meus momentos de infância ...
E' que tu escreves mesmo bem pah ;)


AMORO-TE

(Bolaxinha)

Anónimo disse...

adorei...tá um espectáculo continua assim que vais longe :D
abraço
Gaspar

Anónimo disse...

o tempo
que no seu melhor surge como um instante e nos momentos dificeis é o nosso maior inimigo..
responsavel por sentimentos de saudade, de amor.. responsavel pela recordação..



Dri