sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Magia

Senta-te, e observa. Não fales, eu gosto do silêncio. O silêncio é bom companheiro quando sabemos ouvir, quando percebemos o que ele nos diz. Porque ele também nos ouve. Observa o que diante de ti se apresenta. Gostas? Não me respondas, vejo o reluzir dos teus olhos. Vejo o reflexo deles. Vejo a tua lágrima, vejo o que sonhei ver, vejo. Sonhei tudo o que podia, deixei a hipócrisia de lado e imaginei o que consigo acreditar. Algo plausível, não gosto de cair. Vira-te para mim, e conta-me. Espalha esses teus desejos, quero fazer parte deles.

A segunda lágrima caiu.

E uma terceira também.

Limpas a cara com uma mão, levemente, num gesto rápido e eficaz. O silêncio és tu, agora. Larga a palavra, que eu fiquei sem ela quando senti o coração. Quando ele acelera, demais até para poder respirar. Viras-te para mim, olhas-me nos olhos, e paras o tempo. Vejo-me no reflexo das tuas lágrimas, no teu rosto estranhamente feliz com este solene momento. Em vez de palavras, uma quarta lágrima. E uma quinta. E uma sexta. Limpo a sétima, sentindo o que sentes. Quando falas, o momento é mágico.

' Seria triste não deitar a lágrima. Ela é o conjunto das minhas palavras, e do meu sorriso. Deixa-a correr, ela seguirá o seu curso. Mas não te vou agradecer. Porque tudo isto é um momento, e eu qero tê-lo contigo. Tu és meu. Só meu. Sei que não queres um obrigado. Por isso, dou-te esta lágrima. '

Abracei-a. Senti-a bem junto a mim, cá dentro. Não há forma de fazer alguém inteiramente feliz. Impossível. Mas sei hoje, e amanhã, e depois, que momentos como este valem o que de mais valioso sentimos. Posso ser cruel, e sou, mas isto é viver. Viver é tudo, e nada.

Olha-me. Esquece o mundo, esquece tudo. Foca-te em mim, eu sou o mundo. O teu mundo. Lembras-te do dia, do primeiro dia? Aquele em que te riste do que falei, aquele que sonhaste ser aquela pessoa, a tal, a mais feliz, que te sentaste no passeio e te julgaste pequena, que viste as estrelas e tentaste contá-las, que saltaste e sonhaste voar. Eu não me esqueço. O que consideras poder esquecer, eu faço disso a minha principal memória. Faço do teu sorriso o meu diário. E escrevo o que sonhas. Um dia, irei realizar todos os teus sonhos. Um a um.

Olhamos os dois para o horizonte.

Recuas dois passos, e voltas para trás. Eu sigo o teu caminho. Afastamo-nos daquele momento, felizes. A vida é assim, momentos. O que de tão bonito eu lhe mostrei? Nada. Uma simples paisagem. Com um por do sol. Daqueles diários.

Podes-me criticar, mas não sentiste. Um momento único não é o que preparas, é o que acontece. Podia prever o sol, mas sentiria mágoa. Sei que ele vai ali estar, não gosto. A lágrima caiu, porque fomos nós. Eu, e ela. Só os dois. Num acaso da vida, a sonhar com o que de bom somos.

Se te contasse, perderia a alegria que sinto ao ter essa memória. Por isso esquece. Foge. Posso não vir a ser feliz, mas guardo bem o que outrora me fez feliz. Não sonhes, vive. Isso será o que gostarás de guardar...