segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O Peso Vivido

Antes de mais, obrigado por espalhares a saudade pelos quatro cantos da casa. Até a porta se encrava cada vez que a fecho, dos tempos em que a segurava para não ires embora. O sofá ainda tem a nossa marca, no chão permanece o nosso suor, e no ar sente-se a tua lágrima em forma de perfume esgotado. Será de mim sentar-me sobre a lareira, respirar sobre a memória num gesto lento, profundo, e reviver toda a tua presença em mim? Já fiz de tudo, o que facilmente me competia, de lutar para que nada disto tivesse existido, ou até de virar a página e escrever no vazio. Em ambas as opções, o amanhã nunca foi uma opção e o hoje, parece estar no passado. Todos os verbos são conjugados em sinónimo de ti, mesmo que me sinta o verdadeiro sujeito da acção. Foste o que tiveste de ser. E até foste mais do que devias, mesmo crescendo lado a lado com a minha alegria, e mais subitamente, com o que nunca consegui ser. Mesmo sabendo que tratas a vida como 'tu', e levas a alegria num bolso do casaco, sei ver a nuvem que puseste no teu lugar na outra ponta do sofá. Uma nuvem forte demais para alguém que ainda descobre de onde vem a luz, e de que força são feitos os abraços, de que razão existem as cores ou de que fonte alimenta a nossa chama. Hoje, sentado sobre lágrimas, sinto que dei mais um passo errado. O tal errado. Se hoje sou isto, amanhã não serei diferente. Porque até a diferença se faz com vontade, ânimo e valor, e eu acabo de descobrir que possuo pouco de valores altruístas e actos heróicos de mudar a face do cubo. Se sou o que escrevo, sei certamente que a página ainda está vazia, ou com escritas sem nexo. Poderei ser muito mais do que uma página branca, e ir além da contracapa, mas sei que o peso vivido jamais deixará de ser uma marca. E essa, nem a tua maior vontade conseguirá apagá-la, nem a minha esperança passará de um sonho por acabar.

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