domingo, 5 de dezembro de 2010

A máscara

Sempre insisti em deixar todo este preciosismo de lado, na forte convicção de que o sentir nada teve a ver com o saber, mas sim com a ocasião. Já reclamava o tempo, severamente esquecido, que os dias são meras contagens, e os momentos são meras recordações. A ânsia de viver protegia todos aqueles vazios pouco imaginados por nós, mas deixados a descoberto em cada falha. As máscaras pouco fortes deixavam-nos inocentes, fracos e presos, sempre convictos que o nosso ser não passa de uma realidade, mas sim de um objectivo.
Juntava-se um sorriso, um olá mais prolongado, um abraço desviado ou dois dedos de conversa insultuosos, alargando a nossa falsidade a objectivos pouco claros e, por isso, vazios da nossa imagem. Aqueles vazios nunca verbalizados em amizades duradouras nem em intimidades loucas, com medo que deixem de ser vazios, e passem a ser um mar de mágoas.
O sorriso é um gesto falso. Aquele sorriso, desdenha-te em curiosidades múltiplas, que nem a tua ingenuidade o decifrará. Aquele sorriso satisfaz-te pela aparência, como uma máscara leve sobre cada um dos teus vazios. Não sabes quem eu sou, e nem eu quero saber. Adquiro o real medo da verdade, pela mentira que sabe tão bem. Tão cómoda, tão inocente, como todos aqueles sorrisos que me deixavam alegre, por fora. Um dia entrarás por detrás desta pele, e encontrarás outra, com mais enigmas que o meu ser, com mais dúvidas do que realidades, mais razões do que sorrisos.
Se um dia me olhares e criticares, acreditarei que não sabes quem sou. Se um dia me desviares o olhar, continuarei confiante no meu falso sorriso e na tua falsa razão. Sempre demonstraste o teu sorriso, e eu agradeci-te com o meu vazio.
No fim de cada momento, o tempo soube sempre permanecer intacto mesmo por detrás de cada máscara. Soube permanecer vivo em cada memória por mim esquecida, soube proteger-se da ganância e do medo, e sustentar-se na vivência. Soube agarrar-se á falsidade e deixar-me preso no meio do meu vazio, navegando em ilusões por mim criadas e levadas ao extremo. O sorriso já não encanta, a verdade já não ganha coragem, o medo persegue-nos a cada dúvida.
Se um dia o medo me conquistar, a palavra não será lida em voz alta, não irá soltar-se do tempo, e tudo será o que eu sempre fui: o vazio. Aqui escrevo, e mesmo dentro desta máscara, ouve-me, encoraja-me, que as forças perdem-se. Solta-te, o eu dentro de mim, que já não sei quem tu és, nem quem eu quero ser.

2 comentários:

Ryan disse...

"O sorriso é um gesto falso."

"Não sabes quem eu sou, e nem eu quero saber. Adquiro o real medo da verdade, pela mentira que sabe tão bem"

Passei por aqui e não pude deixar de comentar.
Tu és eu? :o

Anónimo disse...

De vez em quando passo por aqui para tentar perceber o que sentes. Nem sempre escreves porque a intensidade das tuas palavras tem de ser sentida por ti.
Não li todos os teus textos mas acho saber o quanto significam para ti.
Escreves sobre muita coisa, e por vezes consigo identificar-me com os teus anseios.
Já me escreves-te coisas lindas que jamais serão apagadas.
Leio repetidamente o que escreves para perceber o verdadeiro sentido das palavras e sentir mais uma vez a emoção. Boa ou má sinto-me mais proxima de ti.
O passado será para sempre recordado, o sentimento continuará como começou, amizade acima de tudo.
Uma boa amizade é aquela que resiste a tudo.E vejo a nossa assim, umas vezes mais presente do que outras, mas sempre viva.

Para sempre,
R